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domingo, 24 de janeiro de 2010

O TEXTO É EXTENSO, MAS DE EXTREMA RELEVÂNCIA AOS NOSSOS DIREITOS. VALE APENA LER.


Direitos humanos levantam polêmica


Alvo de uma enxurrada de críticas quando lançada, a terceira edição do Programa Nacional de Direitos Humanos, criada por decreto presidencial há dois meses, ainda gera muita polêmica. Setores ligados ao agronegócio e representantes da Igreja Católica ainda protestam contra intenções enumeradas no documento - como a criação de projeto de lei para a descriminalização do aborto, as mudanças no trâmite para resolução de conflitos agrários e a proibição de símbolos religiosos em repartições públicas.

Do outro lado da trincheira, estão movimentos sociais que enxergam, na carta de intenções do governo, avanços nunca antes pensados em áreas tabus como a dos direitos de homossexuais. No Pará, a polêmica em torno do Plano Nacional de Direitos Humanos trouxe à tona e requentou discussões antigas. Itens como o uso e o reconhecimento do nome social por travestis e transexuais em escolas e serviços públicos já são práticas garantidas por decretos e portarias do Estado e podem, agora, ganhar abrangência nacional.

Outros, como a institucionalização da mediação como ato inicial para a resolução de conflitos agrários, ainda soam como realidade distante, para um Estado que não consegue fazer valer quase uma centena de liminares de reintegração de posse já concedidas pela Justiça. 'É patético imaginar que os invasores de terras que destruíram cercas, derrubaram árvores, mataram gado e queimaram casas possam sentar em volta de uma mesa, com os donos das áreas invadidas, para debater a matéria, sendo essa reunião uma condição para que o Judiciário conceda as medidas liminares', pontua o advogado paraense Zeno Veloso, professor de direito e articulista, autor de dezenas obras jurídicas.

Zeno foi convidado por O LIBERAL a comentar alguns trechos do III Plano Nacional de Direitos Humanos. Ele listou, entre as intenções manifestadas no documento, aquelas que podem não sair do papel por conta justamente da abrangência que têm. 'O programa trata questões polêmicas como se fossem assuntos resolvidos, e não são. É bem claro o fato de que (o texto do programa) foi feito não para ser cumprido, mas para um criar um fato político. Conseguiu. É um documento longo que trata de uma gama enorme de assuntos, com temas altamente controvertidos, um colosso', define.


INVIÁVEL


'Quem o produziu sabe que ele, por culpa dele mesmo, dificilmente será cumprido', completa o advogado. 'Quem sabe, para isso e por causa disso é que foi escrito, dessa forma, amazonicamente extenso, complexo, impraticável. Quem o criou sabia que ele não pode ser obedecido e seguido, tantos, controversos, espaçosos são os temas que abrange, os objetivos que pretende, alguns até graves, importantes, mas a respeito dos quais não há um entendimento nacional, e outros absolutamente insignificantes'.

O texto sancionado pelo presidente Lula, em um de seus pontos mais criticados, sobretudo por entidades ligadas ao agronegócio, enumera como intenção propor projeto de lei para institucionalizar a utilização da mediação como ato inicial das demandas de conflitos agrários e urbanos. A ideia é priorizar a realização de audiência coletiva entre invasores e proprietários como ações preliminares à avaliação da concessão de medidas liminares.

Para o deputado estadual Airton Faleiro, líder do governo na Assembleia Legislativa do Estado, a intenção de transformar em lei a mediação nada mais faz do que oficializa uma prática que já existe. 'Não se consegue fazer uma reintegração sem que haja diálogo, sem que haja negociação. Isso já ocorre' diz o petista. A opinião do deputado não é a mesma de que compartilham os movimentos ligados ao agronegócio, puxadas pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). A presidente da CNA, senadora Kátia Abreu (DEM-TO), afirmou que a medida pode estimular a violência no campo, no momento que sugere uma 'flexibilização' do direito de posse.

Documento propõe revisar a Lei de Anistia após embate com militares

Entre as propostas do Programa Nacional de Direitos Humanos está a revisão da Lei de Anistia e a criação da chamada 'Comissão Nacional de Verdade', responsável por examinar as violações de direitos humanos praticadas no contexto da repressão política. Exatamente este trecho foi o único já alterado pelo presidente Lula, depois da polêmica formada entre militares e a Secretaria de Direitos Humanos. Em novo decreto, assinado no último dia 13, que trata especificamente do grupo de trabalho que elaborarará o projeto de lei da Comissão da Verdade, não aparece a expressão 'repressão política'. Uma atenuação que esfriou as discussões, mas não acabou com a polêmica.

'A anistia do jeito que foi pensada e aprovada, ampla, geral e irrestrita, está sendo questionada. Se de um lado havia a repressão e de outro havia a militância, com crimes sendo cometidos por ambos, por que rever apenas um desses lados? Na minha opinião está havendo um pouco de sectarismo neste ponto. O que se quer fazer é uma anistia Saci-Pererê, que não se sustenta por ter uma perna só', diz o jurista Zeno Veloso.

'Anistia é o esquecimento, ‘colocar a pedra em cima’, e isso vale para os dois lados. Se fosse para reabrir as questões e reintroduzir um clima de perseguição, revanchismo, insegurança, tinham de ser revistos os atos dos torturadores, como os dos terroristas. E não é verdade, como andam dizendo, que todos os terroristas foram presos, exilados ou condenados. Exílio, viver alguns anos no exterior, embora muito triste, não é, por si só, causa de purgação de crimes, de extinção de punibilidade.'

Para o líder do governo na Alepa, deputado Aírton Faleiro, 'não se trata de julgar um ou outro lado, mas de corrigir uma injustiça da história'. 'A lei da Anistia foi uma avanço na sua época, mas deixou uma lacuna. Existia um conflito e a correlação de forças entre os dois lados, Estado e oposição, era desigual. Então quem sofreu foi o lado mais fraco.'

Criação de lei que permita união civil de casais homossexuais tem apoio

Na seara dos direitos homossexuais, o Plano de Direitos Humanos apoia duas bandeiras antigas dos movimentos gays no Brasil. A primeira se refere à criação de lei que permita a união civil entre pessoas do mesmo sexo. Uma forma de se garantir o cumprimendo de direitos entre parceiros de uniões homoafetivas tal qual acontece entre casais heterossexuais. A intenção enunciada no Plano de Direitos Humanos é a de 'apoiar projeto de lei que disponha sobre a união civil de pessoas do mesmo sexo'.

'A questão em discussão não é o casamento, é garantir que os direitos civis sejam respeitados também para os casais homossexuais. Para que os bens construídos com o parceiros sejam de direito do outro, em caso de falecimento', diz Paulo Lessa, presidente do grupo Apolo pela Livre Orientação Sexual, de Belém. O segundo e não menos importante ponto da causa homossexual se refere ao reconhecimento e uso do chamado nome social por travestis e transexuais. O nome social é aquele pelo qual travestis e transexuais escolhem ser chamadas.

No Pará, portaria da Secretaria de Educação garantiu, já em 2008, que o nome social fosse usado em todas as escolas da rede pública, caso esta seja a preferência do aluno. Ano passado, o governo do Estado estendeu a determinação a todos os órgãos do serviço público estadual. 'Infelizmente, o Plano de Direitos Humanos é uma política de governo não é de estado', diz Paulo Lessa. 'Mas quem sabe isso não possa servir de brecha para conscientizar a sociedade de que nos queremos apenas reivindicar os nossos direitos. A gente quer, sim, construir uma familia, garantir nosso espaço e ter respeito como qualquer cidadado que faz parte da sociedade e paga seus impostos.'

Exibição de símbolos religiosos em repartições públicas é condenada

O Plano Nacional de Direitos Humanos investe contra a exibição de símbolos religiosos em repartições públicas, e enuncia como intenção 'desenvolver mecanismos para impedir a ostentação de símbolos religiosos em estabelecimentos públicos da União'. O ponto é polêmico e já chegou a ser discutido, em anos anteriores, na suprema corte brasileira. 'A decisão foi a favor da manutenção desses símbolos, como o crucifixo, por exemplo' afirma o jurista Zeno Veloso.

O despacho da juíza federal Maria Lúcia Lencastre Ursaia, da 3ª Vara Cível Federal de São Paulo, que em agosto do ano passado indeferiu um pedido do Ministério Público Federal (MPF) para a retirada dos símbolos dos prédios públicos, ilustra bem o principal argumento contra a ideia de proibição de imagens e crucifixos sugerida no Plano Nacional de Direitos Humanos.

'O Estado laico foi a primeira organização política que garantiu a liberdade religiosa. A liberdade de crença, de culto e a tolerância religiosa foram aceitas graças ao Estado laico e não como oposição a ele. Assim sendo, a laicidade não pode se expressar na eliminação dos símbolos religiosos, mas na tolerância aos mesmos', diz a Juíza, em um trecho do despacho.


ABORTO


Entre as intenções manifestadas na terceira edição do Plano Nacional de Direitos Humanos, está a de 'Apoiar a aprovação de projeto de lei que descriminaliza o aborto, considerando a autonomia das mulheres para decidir sobre seus corpos'. O texto causou repúdio imediato da Igreja Católica, que se manifestou por meio da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Em nota divulgada no último dia 15, a CNBB reafirmou ser 'contrária à descriminalização do aborto, ao casamento entre pessoas do mesmo sexo e o direito de adoção de crianças por casais homoafetivos', três dos itens tratados no 3º Plano Nacional de Direitos Humanos.

'Rejeita, também, a criação de ‘mecanismos para impedir a ostentação de símbolos religiosos em estabelecimentos públicos da União’, pois considera que tal medida intolerante pretende ignorar nossas raízes históricas.'

Controle dos meios de comunicação pode representar retorno da censura

Outro ponto controverso é o que se refere ao controle de conteúdo de meios de comunicação. O Plano de Direitos Humanos enuncia como intenção 'propor a criação de marco legal regulamentando o art. 221 da Constituição, estabelecendo o respeito aos Direitos Humanos nos serviços de radiodifusão (rádio e televisão) concedidos, permitidos ou autorizados, como condição para sua outorga e renovação, prevendo penalidades administrativas como advertência, multa, suspensão da programação e cassação, de acordo com a gravidade das violações praticadas'. Entre as ações programáticas, está a elaboração de critérios de acompanhamento editorial e a criação de um 'ranking' dos veículos 'comprometidos com os direitos humanos'. 'Isso cheira a autoritarismo. É extremamente preocupante essa possibilidade de retorno da censura', pontua Zeno Veloso.

O III Programa Nacional de Direitos Humanos, criado por decreto do presidente Lula em 21 de dezembro de 2009, é um protocolo de intenções que prevê ações multiministeriais voltadas para a garantia dos direitos humanos em diversos setores da sociedade. O documento tem 180 páginas e está dividido em seis eixos orientadores. Estão listados 82 objetivos estratégicos e 521 ações, que incorporam ou refletem as discussões travadas na 11ª Conferência Nacional de Direitos Humanos, ocorrida em Brasília entre 15 e 18 de dezembro de 2008.
Fonte: http://www.orm.com.br/oliberal/
Caderno Atualidades,Belém 24 de Janeiro de 2010.

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